Luciano Takaki | 2022
Eis que me deparo recentemente com um canal no YouTube apresentado por um maçom (desde já “youtuber maçom”) cujo nomes nem de um e nem de outro direi por razões óbvias. Todavia, o vídeo ao qual resolvi assistir para conferir se o discurso deles continuam o mesmo de antigamente tinha por objetivo explicar por que um católico não poderia ser maçom. A primeira coisa que me saltou aos olhos é a semelhança do discurso do maçom com o discurso da maioria dos protestantes, evidenciando assim que protestantes e maçons (ainda que tenha protestantes que se oponham à maçonaria) possuem uma ligação estreitíssima.
Passeando pelos vídeos do canal (que tem mais de 80 mil inscritos já), percebe-se que muitíssimo provavelmente o seu dono tem o objetivo que dissimular o que a maçonaria realmente é. Esse jogo maçônico é muito bem descrito por Monsenhor Henri Delassus, em sua magnífica obra A Conjuração Anticristã, que escreve o seguinte:
O Carbonarismo foi uma sociedade mais secreta na associação secreta da maçonaria. “A franco-maçonaria, diz Copin-Albancelli, é um edifício maquilado que, deliberadamente, deixa ver aos profanos uma fachada estranha e hipócrita, e que abre aos irmãos os apartamentos, cujas centenas de portas, mais ou menos dissimuladas na parede, permanecem perpetuamente fechadas”.
De tal sorte que existem duas maçonarias:
1ª. – aquela que nos permitem ver, porque não podem fazer diferentemente, e que se manifesta através de templos próprios, boletins, revistas, até mesmo dos volumes sabiamente preparados, festas e convenções, por uma organização puramente administrativa de lojas, conselhos e obediências.
2ª. – Aquela que é cuidadosamente escondida, não somente aos profanos, mas também à grande maioria dos afiliados. É do caráter particular da franco-maçonaria ser uma única associação, mas várias associações, organizadas pela superposição de grupos, dos quais os superiores constituem verdadeiras sociedades secretas para os inferiores.
O Carbonarismo, um desses grupos superiores às lojas, foi criado para trabalhar pela derrubada de todos os tronos e sobretudo pelo aniquilamento do poder pontifício, arco de abóbada da ordem social. A Alta Venda foi, dentro do Carbonarismo, uma sociedade mais secreta ainda, recebendo instruções mais misteriosas e mais precisas para dirigir os esforços do Carbonarismo e da maçonaria e fazê-los convergir para o fim que acabamos de assinalar (A Conjuração Anticristã, Castela, 2016, pp. 186s) [grifos meus].
O youtuber maçom cumpre o primeiro papel, por ser o mais exposto, é também o mais dissimulado de todos. O que faz, na melhor das hipóteses, é desmentir algumas lendas urbanas mais exageradas, mas omite os mais sérios. Ademais, o que se vê no vídeo ao qual assisti é basicamente o seguinte:
Primeiro, para o youtuber maçom a Igreja Católica teria uma semelhança não apenas análoga, mas que teria ritos iniciáticos como as da maçonaria mesmo. Como se veria com batismo, crisma, sacramentos da ordem etc. Assim, a Igreja de alguma forma também seria maçônica, o que é uma grande mentira, uma vez que cremos que o que os sacramentos fazem é conferir graça eficazmente ex opere operato e, no caso dos sacramentos mencionados, são sacramentos que imprimem caráter e, no caso dos sacerdotes, ministrar validamente sacramentos que apenas eles podem ministrar. No caso da maçonaria seria bem diferente, pois há apenas uma eleição para subir de grau no qual também supostamente adquirem também novos conhecimentos de segredos que não se pode compartilhar. E é óbvio que isso implica em guardar segredos que em verdade envolvem conspirações contra a própria Igreja. O próprio apresentador do canal faz parte disso, como se demonstrará.
Depois, para ele, a Igreja Católica Romana (assim como ensina a Constituição Dogmática Lumen Gentium, do Vaticano II de forma mais disfarçada) é parte de um todo maior chamado cristianismo. Segundo o youtuber maçom, o cristianismo se divide em várias partes que se tornam mais e mais restritivas e o catolicismo seria uma delas, talvez a mais restritiva de todas e que por isso teria essa regra. Inclusive, ele ensina que existem várias “igrejas católicas”. No caso da Igreja Católica Romana, a proibição teria sido um efeito da má compreensão do Papa Clemente XII, que, como se verá, não é verdade.
Depois dirá que a Igreja também possui “círculos fechados”, e dá como exemplo o colégio de cardeais reunidos em conclave (como referência, o youtuber maçom cita filmes inspirados nos livros do Dan Brown). Todavia, há de se entender que isso não é tão secreto assim, ademais, toda eleição do gênero buscam tornar os votos secretos de alguma forma, geralmente para que ela não fique viciada e não se tenha muitas influências. Isso é assim mesmo nas eleições democráticas. É bem diferente da maçonaria, que possui círculos fechados a ponto de ter células absolutamente secretas como era o caso dos carbonários.
O youtuber maçom recomenda por fim um artigo publicado em seu blog, que tampouco divulgarei aqui, mas antecipo que é muito mal traduzido e há uma infeliz verdade: de que houve uma mudança de relação entre a instituição que hoje é reconhecida como Igreja Católica (a falsa igreja iniciada pelo Vaticano II) e a maçonaria. Houve de fato um abrandamento radical, ainda que em algumas ocasiões se tenha dito que as condenações tenham se mantido. Com efeito, assim foi escrito:
Em data de 19 de Julho de 1974, esta Congregação escrevia a algumas Conferências Episcopais uma carta reservada sobre a interpretação do cân. 2335 do Código de Direito Canónico, que veta aos católicos, sob pena de excomunhão, inscreverem-se nas associações maçónicas e outras semelhantes.
Dado que a citada carta, tornada de domínio público, deu margem a interpretações erróneas e tendenciosas, esta Congregação, sem querer prejudicar as eventuais disposições do novo Código, confirma e precisa quanto segue:
1. não foi modificada de algum modo a actual disciplina canónica que permanece em todo o seu vigor;
2. não foi, portanto, ab-rogada a excomunhão nem as outras penas previstas;
3. quanto na citada carta se refere à interpretação a ser dada ao cânone em questão, deve ser entendido, como intencionava a Congregação, só como um apelo aos princípios gerais da interpretação das leis penais para a solução dos casos de cada pessoa, que podem ser submetidos ao juízo dos Ordinários. Não era, pelo contrário, intenção da Congregação confiar às Conferências Episcopais o pronunciar-se publicamente com um juízo de carácter geral sobre a natureza das associações maçónicas que implique derrogação das mencionadas normas (Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, Declaração sobre a participação de católicos a associações maçônicas, 17 de Fevereiro de 1981).
Bem que gostaria que tal fato seja realmente verdadeiro, mas retornemos ao que Monsenhor Delassus ensina na citação acima, ele escreveu que há “aquela [maçonaria] que nos permitem ver, porque não podem fazer diferentemente, e que se manifesta através de templos próprios, boletins, revistas, até mesmo dos volumes sabiamente preparados, festas e convenções, por uma organização puramente administrativa de lojas, conselhos e obediências”. Mas há ainda um corpo secreto que atua por meio de influências e que é secreta até mesmo para a maioria dos afiliados. Alguém até poderia objetar como sabemos da existência de uma parte da maçonaria tão secreta, mas é só seguir o raciocínio quia, isto é, do efeito para a causa. A maçonaria visível só pode existir por meio de uma causa distinta dela. Isto é, de alguma forma essas lojas são unidas num propósito comum e elas precisam de um liderança que as coordene, mas que não pode ser visível. O próprio Monsenhor Delassus escreve que é “do caráter particular da franco-maçonaria ser uma única associação, mas várias associações, organizadas pela superposição de grupos, dos quais os superiores constituem verdadeiras sociedades secretas para os inferiores”. O que não falta são testemunhos de ex-maçons e dos próprios maçons que confirmam isso.
Desde o Vaticano II, a falsa igreja, mesmo que visivelmente se diga contra as “associações maçônicas”, tem adotado princípios maçônicos. Para isso, basta ler a Declaração Dignitatis Humanae e os documentos que se seguiram (como escrevi nos artigos sobre a liberdade religiosa AQUI e AQUI). Muitos maçons comemoraram o documento assim como também comemoraram a recente encíclica Fratelli Tutti. O fato é que é bem visível também na atuação dos cardeais, bispos e padres. Não vemos mais a mesma oposição que existia antigamente, como já estava evidente nesse discurso de Paulo VI:
O humanismo laico e profano apareceu, finalmente, em toda a sua terrível estatura, e por assim dizer desafiou o Concílio para a luta. A religião, que é o culto de Deus que quis ser homem, e a religião — porque o é — que é o culto do homem que quer ser Deus, encontraram-se. Que aconteceu? Combate, luta, anátema? Tudo isto poderia ter-se dado, mas de facto não se deu. Aquela antiga história do bom samaritano foi exemplo e norma segundo os quais se orientou o nosso Concílio. Com efeito, um imenso amor para com os homens penetrou totalmente o Concílio. A descoberta e a consideração renovada das necessidades humanas — que são tanto mais molestas quanto mais se levanta o filho desta terra — absorveram toda a atenção deste Concílio. Vós, humanistas do nosso tempo, que negais as verdades transcendentes, dai ao Concílio ao menos este louvor e reconhecei este nosso humanismo novo: também nós — e nós mais do que ninguém somos cultores do homem (Discurso na última sessão pública do Concílio Vaticano II, 7 de dezembro de 1965). [grifos meus]
Nesse discurso, Paulo VI renunciou formalmente ao combate contra o maior inimigo da Igreja nos últimos tempos; se não há luta, há concessões. Nesse vídeo ao qual assisti, o youtuber maçom declara que o fim da maçonaria é “despertar” o homem, que é um eufemismo para a deificação do homem. Paulo VI menciona claramente a religião maçônica como descrita por Monsenhor Delassus:
Numa obra editada em Friburgo, sob o título A deificação da humanidade, ou o lado positivo da franco-maçonaria, o padre Patchtler bem demonstrou o significado que a maçonaria dá à palavra “humanidade” e o uso que dela faz. “Essa palavra, diz ele, é empregada por milhares de homens (iniciados ou ecos inconscientes dos iniciados), num sentido confuso, sem dúvida, mas sempre, entretanto, como o nome de guerra de um certo partido para uma certa finalidade, que é a oposição ao cristianismo positivo. Essa palavra, na boca deles, não significa somente o ser humano por oposição ao ser bestial… ela coloca, em tese, a independência absoluta do homem no domínio intelectual, religioso e político; ela nega todo fim sobrenatural do homem, e requer que a perfeição puramente natural da raça humana seja encaminhada pelas vias do progresso. A esses três erros correspondem três etapas na via do mal: a Humanidade sem Deus, a Humanidade que se faz de Deus, a Humanidade contra Deus. Tal é o edifício que a maçonaria pretende erguer no lugar da ordem divina que é Humanidade com Deus (loc.cit., p. 37). [grifos meus]
Aqui cabe uma pergunta interessante: como o youtuber maçom ainda ousa dizer que a maçonaria não se opõe à Igreja Católica? Que hoje a maçonaria adota uma estratégia menos virulenta, diferente da época em que matava sacerdotes, pilhava bens da Igreja, roubou os Estados Pontifícios e massacrou outros padres e católicos na Guerra Civil Espanhola e Guerra Cristera, talvez possa conceder; mas hoje a oposição se dá em outro nível, ela é disfarçada com um discurso de tolerância ou talvez abertura ou mesmo acolhimento. No próprio artigo compartilhado deixam explícito que nenhum católico é proibido de ingressar na maçonaria, dando um ar de convite. O problema é que o católico autêntico possui convicções que se opõem absolutamente às convicções maçônicas. Para começar, o católico deseja a glória da Igreja Católica, o maçom deseja a sua destruição para construir sobre as ruínas dessa Igreja o seu Templo. Maçom, como ensina Mons. Delassus, é basicamente isso: pedreiro (em francês, maçon), alguém que trabalha na construção desse templo. Daí eles usarem compassos, esquadros e trolhas em seus rituais. Ademais, que maçons sempre conjuraram para acabar com a Religião de Nosso Senhor Jesus Cristo, Voltaire, por exemplo, na Grande Loja de Londres, consagrou toda sua vida para destruir a Religião e sempre se empenhou nisso (Mons. HENRI DELASSUS; loc.cit., p. 81).
A regra é simples: a Religião Católica é a religião de Deus que se fez homem e busca a glória de Deus, a maçonaria fomenta a religião do homem que se faz Deus e busca a própria glória. A oposição é radical e a maçonaria não fez mais que conspirar contra a Igreja e hoje adotam a estratégia de por meio de influências difundir a ideia de que as religiões são iguais e que todas igualmente podem levar à salvação. Outra forma é difundir o relativismo moral, pois a maçonaria propõe ou legalização do aborto ou ao menos um “debate” sobre o assunto, que significa tornar possível o infanticídio intrauterino, assim como a união civil de sodomitas (ou o debate sobre o assunto). Hoje, a maçonaria, com a ajuda de financiamento de banqueiros e grandes capitalistas (quase sempre judeus), conseguem influências na imprensa e na mídia, assim como na educação, já denunciado por Sua Santidade Leão XIII (cf: Carta Encíclica Humanus Genus, n. 21, 20 de abril de 1884). Suspeito que o youtuber maçom tenha os seus benfeitores, por assim dizer. Ademais, retornando o assunto, Igreja sempre pregou que fora dela não pode haver salvação, pensamento radicalmente oposto da maçonaria. É evidente que o youtuber maçom se opõe também, juntamente com a maçonaria, à Igreja Católica, a ponto de espalhar as mesmas mentiras dos protestantes com a intenção de denigri-la.
Assim, conclui-se que a maçonaria conspira contra a Igreja, exalta a deificação do homem e busca o domínio sobre a humanidade atualmente por meio de influências se utilizando mesmo de divergências e oposições entre as lojas de forma dissimulada. Governada sob um espírito diabólica, a maçonaria assim consegue não apenas ingressos iniciados como apoiadores indiretos. Assim, encerro com uma citação de Leão XIII, provavelmente o papa que mais combateu a maçonaria:
Agora é desnecessário colocar as seitas Maçônicas em julgamento. Elas já estão julgadas; seus fins, seus meios, suas doutrinas, e sua ação, são todos conhecidos com indisputável certeza. Possuídos pelo espírito de Satanás, cujos instrumentos eles são, eles ardem como ele com um ódio mortal e implacável a Jesus Cristo e Sua obra; e eles se esforçam por todos os meios para derrubá-la e acorrentá-la. Esta guerra no momento presente se desenrola mais do que em qualquer outro lugar na Itália, na qual a religião Católica se enraizou mais profundamente; e acima de tudo em Roma, o centro da unidade Católica, e a Sede do Pastor Universal e Mestre da Igreja (Carta Encíclica Dall’Alto Dell’Apostolico Seggio, n. 2, 15 de outubro de 1890).
Olá, Salve Maria.
Você saberia me indicar livros sobre a interpretação católica do apocalipse?
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Salve Maria!
Caríssimo, não li comentários inteiros ao Apocalipse, visto que comentários bíblicos geralmente são muito extensos. Geralmente são vários tomos. Ademais, conheço os comentários do Cardeal Manning e o Padre Charles Arminjon sobre o Anticristo. Seria interessante buscá-los. São autores de grande autoridade.
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