O ALCANCE DA INFALIBILIDADE

John S. Daly
2005

Pareceria que poucos católicos de nossos dias têm ideia justa da extensão das garantias e da proteção que o Espírito Santo assegura à Igreja. E estas são tão vastas, que a elas consagram-se livros inteiros. Existe ua maneira simples de preencher essa lacuna com exatidão de expressão, economia de palavras e justeza doutrinal garantida. Consiste em pôr diante do leitor o resumo dos dizeres da própria Igreja sobre o assunto, resumo este que se encontra no Index systematicus do Enchiridion Symbolorum de Denzinger, acrescentando-lhe dois textos complementares de teólogos reconhecidos.

Tendo o magistério da Igreja se pronunciado formalmente, no decurso de vinte séculos, sobre numerosos pontos sob diferentes formas, Heinrich Denzinger elaborou, na metade do século XIX, um apanhado dos textos dogmáticos, que foi mantido em dia por diversos editores desde então. É por essa razão que, para citar facilmente um texto do magistério, dá-se geralmente a referência ao parágrafo de Denzinger onde ele se encontra.

No fim desse apanhado encontra-se um “índice sistemático” que constitui um compêndio extremamente denso da doutrina católica. Cada doutrina é resumida em poucas palavras, seguidas de referência aos parágrafos onde os textos do próprio magistério ensinam a doutrina transmitida.

Com relação à infalibilidade, distinguem-se o fato, o sujeito, o objeto e, por fim, o exercício. Como o erro ou ignorância tão disseminado hoje em dia refere-se principalmente ao último ponto (o exercício), oferecemos aqui, em tradução vernácula, essa breve parte do Índice (seção ii f). Não se trata da opinião de um teólogo, mas de resumo seco, e antes minimizante, daquilo que o magistério disse sobre o seu próprio exercício.

Para poder estudar as numerosas divergências doutrinais entre a Igreja Católica e a Igreja Conciliar, é necessário conhecer os limites da infalibilidade tais como a própria Igreja Católica os concebe.

Completamos o texto de Denzinger com alguns excertos tirados do livro utilizado pelo Santo Ofício sob Pio XII para qualificar o status teológico das diferentes doutrinas e dos diferentes erros que se opõem a elas. Trata-se do De Valore Notarum Theologicarum, do Pe. Sixtus Cartechini S.J. Um minúsculo excerto do Cardeal Billot conclui esta clarificação.

Se muitos leitores encontrarão surpresas nestes textos, no entanto sua doutrina toda está implícita nas palavras de São Paulo a Timóteo: “a Igreja do Deus vivo, a coluna e o sustentáculo da verdade”; e mais explicitamente em Santo Agostinho: “a Igreja de Deus, estabelecida em meio a tanta palha e cizânia, tolera muita coisa; contudo, ela não aprova, nem passa em silêncio, nem faz aquilo que se opõe à fé ou à virtude” (Epístola 55 – “Sed Ecclesia Dei inter multam paleam multaque zizania constituta, multa tolerat, et tamen quæ sunt contra fidem vel bonam vitam non approbat, nec tacet, nec facit.”)

John Daly

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Resumo da doutrina do Magistério sobre o Magistério
por Denzinger.

1. A Igreja exerce sua infalibilidade seja por juízo solene seja pelo magistério ordinário universal 1683 1792 c. 1323 § 1;

2. … ao definir a verdade revelada 1721;

3. … ao vigiar a fé de seus súditos 1444 c. 247, o que ela faz por direito e por dever 1797 et seq.;

4. … ela não pode negligenciar a verdade 1449;

5. … [ela não pode] se opor à verdade 1450;

6. … [ela não pode] permitir que sejam obscurecidas as mais importantes verdades de fé ou moral 489 1455 et seq. 1449 1501 1552 et seq. 1567 1576 et seq. 1821 1967;

7. … [ela não pode] voltar atrás quanto a erros já (definitivamente) condenados 161;

8. … [ela não pode] mudar o sentido de um dogma definido 2080;

9. … [ela não pode] estabelecer disciplina nociva 1578;

10. … cumpre porém aquiescer ao seu julgamento mesmo em matérias que não estão ainda expressamente definidas 1683 et seq. 1712 1722 1820 2113 et seq. 2313 c. 1324;

11. … e o silêncio obsequioso não é suficiente 1350.

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Excertos do Padre Cartechini para uso do Santo Ofício

O magistério ordinário… infalível… se exerce de três maneiras:

1. por doutrina expressa comunicada sem ser por definição formal pelo Pontífice ou pelos bispos do mundo inteiro;

2. por doutrina implícita contida na prática ou vida da Igreja:

a) a Igreja… não pode permitir que sejam ditas em seu nome na liturgia coisas contrárias ao seu sentir ou à sua crença;

b) no Código de Direito Canônico não pode haver nada que seja de algum modo oposto às regras da fé ou à santidade evangélica;

3. pela aprovação tácita que a Igreja concede a uma doutrina dos Padres, dos doutores ou dos teólogos.

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Um texto do Cardeal Billot

“Tudo o que é pregado na Igreja inteira como sendo divinamente revelado pertence por esse fato mesmo, e independentemente de toda definição conciliar ou pontifícia, à fé católica – à qual se opõe a heresia. E afirma-se corretamente que um sinal sem equívoco dessa pregação é o consenso constante e unânime dos teólogos católicos. Digo que é um sinal e nada mais, pois os teólogos enquanto tais não pertencem à Igreja docente… mas é sinal certo e sem equívoco…

“E, antes de tudo, essa doutrina é confirmada pois quem quer que leia os catálogos de heresias de Santo Agostinho ou de Santo Epifânio verá que muitas delas, à época desses santos, não se opunham a nenhuma definição solene. Mas eram consideradas heresias, porque, para tanto, é suficiente a contrariedade certa e notória com aquilo que é ensinado como pertencente à fé pelo exercício cotidiano do magistério através da Igreja inteira… E, com efeito, tão logo Ário, Macedônio, Nestório começaram a enunciar suas doutrinas, foram eles… denunciados como hereges.”
(De Ecclesia, q. X).

Trad. por Felipe Coelho

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