TEMPO PASCAL

Dom Gaspar Lefebvre, O.S.B.
1950

I. Exposição dogmática: Páscoa

A Igreja, que vai anualmente renovando na liturgia os sucessos da vida do Salvador, dos quais nos convida a participar, celebra nas festas da Páscoa o aniversário de Jesus vitorioso sobre a morte. E o acontecimento central de toda a história, para onde converge toda a vida radiosa do Redentor, e o ponto culminante da vida da Igreja no seu ciclo litúrgico. [Memorial da morte e ressurreição do Senhor, a missa foi como o grão de mostarda, de que procede toda a liturgia católica (D. CABROL : Le Livre de la prière antique, cap. VI). Tendo o Senhor ressuscitado num Domingo, substituiu-se este dia ao Sábado Judaico e tornou-se por este motivo o dia oficial do sacrifício cristão, Já vimos que a Quaresma e a Septuagésima são um período de preparação para a Páscoa e que o tempo pascal e o depois do Pentecostes o seu prolongamento. Igualmente fizemos notar a íntima relação que existe entre o mistério do Natal e o da Páscoa e podemos juntar que todo o ano litúrgico, todo o culto católico, gravitam à volta deste Mistério.]

A Ressurreição do Salvador é a prova irrefragável da sua divindade, porque era necessário, com efeito, ser Deus para poder, como dizia Jesus, «depor a vida e torná-la a rehaver», e a base indestrutível da nossa fé.

A Páscoa é a sanção definitiva da vitória da humanidade sobre a morte, a carne e o mundo. Porque, de direito, nos moremos rio ressuscitamos a carreus Cristo; de facto, é a virtude operante dos mistérios da redenção que fecunda e transforma a vida íntima da Igreja e dos fiéis.

Todos os anos, a Igreja, ao recordar-os do Ressurreição do Senhor e baptismo que nos permitiu a participação efetiva neste grande mistério, mergulha-nos, por assim dizer, num banho novo que nos regenera e transforma para a vida nova da graça. Por este motivo a Páscoa cristã, mais que o aniversário dum acontecimento histórico, é o prolongamento da Ressurreição do Senhor. O Martirológio Romano, com efeito, proclama que a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo é a solenidade das solenidades e a nossa Páscoa , fórmula que encerra a réplica perfeita do mistério do Natal. Porque se no Natal devemos nascer com o Senhor para a vida divina que desceu com Ele à terra, na Páscoa com igual razão devemos ressuscitar para a vida nova que nos mereceu com a sua Paixão. Isto permite-nos compreender que a Igreja tenha escolhido a Páscoa para se dedicar com carinho verdadeiramente maternal à formação daqueles que são, na frase de S. Paulo, os filhos «recém-nascidos» das chagas do Senhor, alimentando-os com o pão novo e instruindo-os nas coisas da vida sobrenatural. «Se ressuscitastes com Cristo, procurai o que é do alto, da vida nova a que fostes chamados, e não o que é da terra.» «Mortificai os apetites da carne, despojai-vos do homem velho, revesti-vos do novo.» Quando depuserdes a túnica branca do baptismo, pensai que deveis conservar sempre a brancura da vossa alma, diz S. Agostinho.

O Tempo Pascal deve ser, pois, para nós todos um período de renovação. Deve ser a imagem da vida do céu. A vida sobrenatural e a alegria dos baptizados deve ser na terra a antevisão, a ante-experiência dulcíssima da ressurreição final e da posse definitiva da pátria celeste, onde Jesus nos precedeu para nos preparar o lugar.

2. Exposição histórica : Páscoa

A liturgia convida-nos neste período a acompanhar as várias aparições do Senhor: no sepulcro, em Emaús, na Galiléa e no Cenáculo; e apresenta-no-lo lançando os fundamentos da Igreja e preparando os Apóstolos para o mistério da Ascensão. 

No dia seguinte ao sábado, ainda com o lusco-fusco, Maria Madalena é mais duas santas mulheres foram ao sepulcro. Era o primeiro dia da semana judaica: o Domingo de Páscoa. Um anjo tinha removido a pedra que tapava o sepulcro e os guardas fugiram com medo. Madalena, ao ver o túmulo aberto e vazio, corre a advertir Pedro e João, que ficaram em Jerusalém, de que tinham roubado o Senhor. Entretanto, o Anjo anunciava às outras duas que Jesus ressuscitara.

Pedro e João voam ao sepulcro e constatam dolorosamente a falta do Mestre. O corpo de Jesus não estava ali. Tinham-no roubado certamente. Madalena, que regressara depressa, quer ver de novo. Talvez se tivesse enganado. E senão, há de ver e beijar pelo menos o lugar onde repousara o Corpo do seu Amigo. E viu. Viu, não o Cristo morto nem o lugar vazio, mas o Cristo vivo e ressuscitado. À tarde desse mesmo dia, dois discípulos, que desciam para Emaüs, veem também o Mestre e veem anunciar a boa nova aos Apóstolos que por sua vez lhe dizem da aparição a Pedro.

Depois, apareceu no Cenáculo. E oito dias depois volta a aparecer-lhes para repreender e confirmar na fé a incredulidade de Dídimo. Depois da oitava da Páscoa, regressando os Apóstolos à Galiléa, o Senhor aparece nas praias do mar aos sete que pescavam e revela-se igualmente a quinhentos discípulos numa montanha que previamente lhes designara e que terá sido o Tabor ou, com maior probabilidade, qualquer colina nas margens do lago, como a das Bem-aventuranças.

O Evangelho do 2° Domingo depois da Páscoa refere-nos a parábola do Bom Pastor, e muito a propósito, a seguir ao baptismo dos neófitos.

O dos três Domingos seguintes e o da vigília da Ascensão são tirados dos capítulos 16 e 17 de S. João, quer dizer, do discurso da Ceia, em que o Senhor fala aos Apóstolos da Ascensão, da vinda do Espírito Santo e da sua nova presença entre os discípulos.

3. Exposição litúrgica: Páscoa

O Tempo Pascal é, por assim dizer, um longo dia de festa que vai da Vigília Pascal até ao Sábado depois do Pentecostes, e em que se celebram sucessivamente os mistérios da Ressurreição e da Ascensão do Salvador, tendo por epílogo a solenidade de Pentecostes. A data da Páscoa, de que dependem as demais festas móveis, foi objecto das decisões conciliares. Tendo o Senhor padecido e ressuscitado na Páscoa judaica e devendo a solenidade do novo mistério substituir na idade nova os velhos ritos mosaicos, houve a Igreja por bem conservar para a Páscoa cristã o modo de contar dos Judeus. Ora entre o ano lunar, que eles seguem, e o solar há uma diferença de onze dias, que obriga a festa da Páscoa a oscilar entre 22 de Março e 25 de Abril.

Durante o Tempo Pascal, a Igreja adorna-se com profusão e os órgãos que na Quaresma se conservaram emudecidos ressoam de novo nas abóbadas engalanadas dos templos. O Aleluia, que é o cântico por excelência do ciclo pascal, enche as almas de alegria e plenitude. Ao Asperges substitui-se o Vidi aguam, evocativo da água e do sangue que correram do lado de Jesus e símbolo do baptismo e da Eucaristia. Não há jejum e o Regina Cœli recita-se de pé, como convém a vencedores. Até à Ascensão o Círio Pascal, símbolo da presença visível de Jesus, ilumina e aquece com a sua chama radiosa a assembleia dos fiéis; e os paramentos brancos, sinal da graça da Ressurreição, alegram as funções do culto.

Outrora, a Igreja proibia no Tempo Pascal as festas dos santos menos notáveis para não distrair a atenção dos fiéis da contemplação de Jesus triunfante. Mas para os Apóstolos e Mártires compôs-se missa especial, por lerem sido eles quem de mais perto se associou às lutas e à vitória de Cristo. Os Mártires, sobretudo, nesta parte do ano, formam o cortejo do Divino Ressuscitado.

Excerto de: Dom Gaspar Lefebvre, O.S.B.; Missal Quotidiano e Vesperal, Les Press St-Augustin, 1956, Nihil Obstat, 28 de junho de 1950, Imprimatur, 29 de dezembro de 1955, pp. 581-583.

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