John S. Daly | 1999
Eu mantive desde o começo de 1983, e ainda mantenho, que a Santa Sé está vacante no presente e que quem segue a falsa religião do Vaticano II, aceitando as suas doutrinas e ritos alterados, não deve ser considerado católico.
Durante a maior parte desse tempo, eu também defendia as seguintes três proposições:
1. Todos os que consideram João Paulo II papa devem ser, por esse mero fato e por essa só razão, considerados acatólicos em virtude, ao menos, de cisma.
2. Todos os que rejeitam João Paulo II, mas permanecem em comunhão com quaisquer outros que reconheçam João Paulo II como papa, devem ser, por esse mero fato e por essa só razão, considerados acatólicos em virtude, ao menos, de cisma.
3. Todos os que rejeitam João Paulo II mas permanecem em comunhão com aqueles que sustentam determinados outros erros, ou que foram culpados de certas outras faltas, tais como defenderem a tese guérardiana ou frequentarem clero descendente da linhagem Thuc, devem ser, por esse mero fato e por essa só razão, considerados acatólicos em virtude, ao menos, de cisma.
Recentemente, devotei estudo muito detido às razões pelas quais eu sustentava cada uma dessas últimas três posições. Como resultado, fui forçado a abandoná-las. Não acredito mais que qualquer uma das três proposições acima represente a correta avaliação católica daqueles a quem se refere. Para explicar as razões da minha mudança de opinião farei referência, principalmente, à primeira dessas três proposições.
Quais eram as minhas bases para crer que alguém que rejeitasse as falsas doutrinas e a falsa Missa de João Paulo II fosse automaticamente um cismático, caso estivesse enganado pelos argumentos daqueles tradicionalistas que alegam que, apesar dos erros dele, ele ainda é o papa?
Oito Argumentos para a Velha Posição
Minhas bases para crer como eu cria incluíam a maioria dos argumentos seguintes:
1. A igreja encabeçada por João Paulo II não é a Igreja Católica. Quem reconhece João Paulo II como cabeça de sua religião deve ser membro daquela falsa igreja e, portanto, não da Igreja Católica.
2. A afiliação exterior a uma religião falsa cria uma presunção de pertinácia no foro externo, i.e. a Igreja trata os assim seduzidos como estranhos à comunhão dela ainda que eles possam estar interiormente de boa fé.
3. Separar-se a si próprio de um verdadeiro papa é ato cismático, então o mesmo se aplica, logicamente, à comunhão com um falso papa.
4. O cânon 2.200/2 exige presumirmos malícia no foro externo quando a lei é infringida exteriormente. (Eu mesmo não apliquei esse argumento à heresia e ao cisma desde 1989, mas outros continuam a empregá-lo.)
5. É impossível justificar a continuidade na aceitação de João Paulo II como papa, à luz dos fatos relevantes, sem cair em falsa doutrina.
6. Certos episódios da história da Igreja mostram que quem permanece em comunhão com hereges públicos sem esposar as heresias deles é considerado cismático.
7. Os tradicionalistas que reconhecem João Paulo II como papa exibem uma mentalidade cismática ao ignorarem-no de um modo que constituiria cisma se ele realmente fosse verdadeiro papa.
8. Quando esses tradicionalistas são confrontados com provas do erro deles, e provas de que João Paulo II não é papa, eles comumente manifestam a pertinácia deles refugiando-se numa variedade de evasivas sofísticas daquela conclusão obrigatória e inescapável.
Após pesquisa cuidadosa, estou agora satisfeito que nem uma única dessas considerações pode ser invocada validamente para justificar a conclusão a que elas visavam.
A verdade simples, agora mantenho, é que ninguém é culpado de cisma ou heresia a não ser que seja pertinaz em seu erro, e não há razão suficiente para julgar que todos aqueles tradicionalistas que ainda creem que João Paulo II é papa sejam pertinazes; nem tampouco há base alguma no Direito Canônico para presumir a pertinácia exigida.
Ninguém é herege a não ser que rejeite deliberadamente a regra da fé estabelecida por Deus – o Magistério Católico – ao negar ou duvidar de um dogma conscientemente. (1) E ninguém é cismático a não ser que voluntariamente recuse submissão à Santa Sé ou comunhão com a Igreja Católica. (2)
É certamente possível, em alguns casos, inferir a presença de pertinácia a partir do fato de que o indivíduo em questão não tem como, de modo crível, estar de boa fé, mas essa conclusão não deveria ser tirada com demasiada facilidade. (3)
Não vejo fundamento para fazer uma tal inferência com relação a todos os tradicionalistas que continuam a imaginar que Karol Wojtyla é papa. Os envolvidos rejeitam as mudanças do Vaticano II na liturgia e doutrina, mas creem que Wojtyla ainda é papa porque pensam que os efeitos canônicos da heresia não ocorrem automaticamente e porque seguem a opinião daqueles teólogos que mantêm que um herege pode continuar a ser papa: Caetano, Suarez e João de S. Tomás. Essa era a minha própria posição até que, em janeiro de 1983, depois de quase um ano de estudo, reflexão e debate, percebi que ela estava errada. É muito comum que seja precisamente o medo de cair em cisma o que faz os tradicionalistas continuarem a aderir a Wojtyla a despeito das heresias dele.
Resposta aos Oito Argumentos
A aceitação de Wojtyla implica em ser membro da seita dele? Se o indivíduo rejeita as heresias e os conventículos daquela seita, mas está confuso quanto ao estatuto do próprio Wojtyla, a inferência é completamente gratuita. Um soldado que passa para o exército inimigo é um traidor, mas um que perde o rumo na neblina e marcha com o inimigo porque confundiu-os com as forças amigas, claramente, não é nada assim. (4) Similarmente, se um alemão fosse ludibriado a crer que Jacques Chirac era o presidente da Alemanha e declarasse, em razão disso, sua submissão a ele, por nenhum processo legítimo de raciocínio poder-se-ia inferir que ele abandonou sua cidadania alemã e adotou a nacionalidade francesa.
Há presunção de pertinácia como resultado da adesão a uma falsa religião? Se alguém adere conscientemente a uma religião falsa, indubitavelmente que há. Do contrário, não existe nenhuma autoridade que dê respaldo a essa noção. Constatar-se-á que todos os autores citados em apoio dessa visão estão se referindo a um caso em que nenhuma confusão era possível: o malfeitor aderiu a uma seita herética sabendo que ela não era a Igreja Católica.
Mas não é um ato cismático aderir a um falso papa? Certamente seria um ato de cisma rejeitar um papa verdadeiro e não pode ser menos cismático aderir a um papa falso?
Não. Na realidade, não é um ato de cisma rejeitar um papa verdadeiro, se alguém o faz não por desejo de abandonar a comunhão da Santa Sé mas porque duvida razoavelmente de se ele é ou não é realmente legítimo. Isso é ensinado claramente por numerosos teólogos e canonistas, e o ensinamento deles refuta definitivamente o erro de quem pensa que a separação involuntária e inconsciente do verdadeiro ocupante da Sé Romana cria uma presunção automática de pertinácia. (5)
Assim, quem rejeita um papa verdadeiro com base num erro inocente e sem intenção pertinaz de separação da Santa Sé permanece católico. Tanto mais isso se aplicaria a quem equivocadamente aceita um falso papa como verdadeiro.
Claro que João Paulo II não é apenas um pretendente ilegítimo: ele é um pretendente publicamente herético. Mas isso não consuma o fato do cisma, já que teólogos renomados sustentaram, embora de modo obstinadamente equivocado, que um papa herege não perde o seu ofício automaticamente. É possível mostrar que essa visão é errada e não se pode aplicar a João Paulo II, mas não é possível mostrar que todos os que pensam que pode sejam definitivamente pertinazes. A pertinácia consiste na recusa de aceitar o julgamento direto da Igreja, não no malogro em seguir uma cadeia de raciocínio, por mais deplorável que esse malogro possa ser. Além disso, a Cum Ex Apostolatus Officio do Papa Paulo IV, ao mesmo tempo que prescreve que a eleição de um herege ao papado seria inválida, meramente permite que os fiéis se separem do culpado (à medida que, e quando, eles reconhecerem a invalidade da eleição). Ela não sugere que os que ficarem para trás em o fazer devam ser considerados cismáticos, e é, aliás, bem incompatível com essa visão.
O cânon 2.200/2 ajuda? Não. Não tem absolutamente nenhuma aplicação relevante aqui. Nem heresia nem cisma existem onde não há pertinácia. A pertinácia é essencial para o crime. Presumir pertinácia onde ela não é evidente seria presumir o próprio crime, não apenas a culpa. (6) Os autores aplicam o cânon 2.200/2 a um caso de heresia em que um padre pregasse heresia manifesta do púlpito porque um atirador escondido ameaçou atirar nele caso ele não o fizesse. (7) Temos aí profissão exterior e consciente de heresia, mas sem pertinácia, porque a crença interior do padre permaneceu ortodoxa. Nenhum autor defende a aplicação do cânon 2.200/2 ao caso de alguém que sustenta uma doutrina não ortodoxa ao mesmo tempo que acredita sinceramente que ela seja ortodoxa, ou que adere a um não papa ao mesmo tempo que sinceramente crê que ele seja papa. É um erro considerar que tais casos sejam de heresia ou cisma cometidos de boa fé (8). Não há nenhuma heresia ou cisma onde o indivíduo sinceramente deseja manter a Fé Católica e submeter-se à Santa Sé, mas está confundido sobre um ponto de fato acerca do que a Igreja ensina ou de quem de fato é o papa.
Mas a aceitação de João Paulo não conduz a crenças que são incompatíveis com a Fé Católica? Certamente, se levada à sua conclusão lógica, conduz. Um tradicionalista que adere a Wojtyla tem de sustentar, se pressionado, que verdadeiros papas podem ensinar o erro pelo exercício habitual do Magistério Ordinário durante quarenta anos, e que a Igreja Católica, por sua práxis, leis e liturgia, pode desencaminhar as almas. Nenhuma dessas duas proposições é conciliável com a Fé Católica. Todavia, diversos passos de raciocínio estão envolvidos para demonstrar que a aceitação de Wojtyla como papa conduz inevitavelmente à não ortodoxia. Em casos assim, a Igreja não assume que todos os envolvidos tenham entendido a conexão e de fato defendam o erro, muito menos supõe Ela que eles sejam pertinazes em defendê-lo. (9) Nem todo o mundo que sustenta uma posição adverte para, e admite, todas as suas consequências lógicas, muito menos se cada uma dessas consequências é ou não é necessariamente compatível com a sã doutrina, talvez nunca aprendida ou estudada de maneira adequada. Nem a ignorância nem o desatino são prova de pertinácia.
Ademais, uma concessão especial tem de ser feita em nossos dias, quando é genuinamente difícil, ao avaliar a situação com que nos confrontamos, enxergar qualquer solução que não tenha ao menos aparência de não ortodoxia. Muitos tradicionalistas se esquivam da solução sedevacantista porque ela é difícil de conciliar com o dogma do Vaticano I de que a Igreja sempre terá bispos, e difícil de conciliar com o ensinamento de muitos teólogos de que a aceitação pacífica pela Igreja confirma a validade de um pontificado (10), entre outras dificuldades.
Nossa situação é reminiscente daquela que prevaleceu durante o Grande Cisma do Ocidente, outra época de grande confusão. A dificuldade de enxergar como a situação poderia ser retificada levou muitos católicos a abraçar a noção heterodoxa de que um concílio poderia ser superior a um papa e o depor. Isso era inquestionavelmente incompatível com a doutrina católica (11), mas confusão inocente era possível, e compreensível dadas as circunstâncias. A Igreja jamais considerou os que sustentavam essa posição como tendo sido hereges ou cismáticos. Ela considera-os como tendo estado confusos e errados acerca de um ponto de doutrina, mas apesar disso bons católicos e edificantes. O mesmo pode se aplicar a alguns dos que ainda, equivocadamente, aderem a João Paulo II.
E quanto às lições da história? É verdade que alguns Padres da Igreja trataram como cismáticos aqueles que frequentaram os conventículos de hereges sem chegar a aceitar as doutrinas heréticas. Mas estamos considerando aqueles que não vão aos conventículos do Novus Ordo. É verdade que os que estavam em comunhão com hereges eram considerados cismáticos… mas só quando a pertinácia deles era considerada evidente. Nenhum Padre da Igreja ou Santo condenou como cismático aqueles (especialmente entre os simples sacerdotes ou o laicato) que permaneceram em comunhão com um prelado herético não condenado, sem aceitar as heresias dele.
Na avaliação da pertinácia há uma clara diferença entre a atitude dos santos Jerônimo e Epifânio, de um lado, e dos santos Hilário e Crisóstomo, de outro. Todos eles são santos. A atitude mais moderada dos últimos é a que acabou sendo aceita pela Igreja, como vemos pelo tratamento de Berengário ou a atitude de São Roberto Bellarmino para com Miguel Baio. As autoridades da Igreja dispenderam todos os esforços para acreditar na boa fé dos que erraram, mesmo sobre questões muitíssimo mais claras do que as que enfrentamos hoje. E um indivíduo particular terá o direito de ser menos compreensivo, e mais severo, do que a Inquisição Romana?
Os partidários dos falsos papas durante o Grande Cisma do Ocidente, ou do cisma de Pietro Pierleone (Anacleto II), não foram considerados cismáticos, devido à confusão que predominava.
Mas os tradicionalistas que reconhecem João Paulo II não o tratam de um jeito que os caracterizaria como cismáticos se eles assim tratassem um verdadeiro papa? Isso não trai uma mentalidade cismática?
É verdade que nenhum católico pode tratar um papa verdadeiro como esses tradicionalistas confusos tratam Karol Wojtyla, ignorando-o, desobedecendo às ordens dele ainda quando sejam intrinsecamente inofensivas etc. Mas a razão de eles o tratarem assim é que eles percebem, corretamente, que submeter-se a ele seria ainda mais flagrantemente inaceitável. O reconhecimento equivocado dele como papa apresenta-lhes o dilema de ou obedecerem-no e comprometerem a Fé que possuem, ou desobedecerem-no habitualmente e destarte serem praticamente cismáticos quanto a ele. Eles não enxergam que o dilema só pode ser ilusório. Estão a meio-caminho entre a submissão a João Paulo II e a rejeição total da usurpação dele. É inegável que esse ponto intermédio implica num compromisso que a doutrina católica não pode aceitar, mas tem de ser admitido que o motivo do erro não é um mal em si mesmo: o espírito cismático. A causa do erro é o fato de eles terem visto corretamente que não é possível a um católico tratar Wojtyla como papa, sem terem a coragem e o discernimento de ver que ele não é papa. Quantos de nós, que chegamos à posição de que João Paulo II não é papa, atingimo-la sem passar por essa posição de compromisso? E, quando nós é que estávamos nessa posição, era devido ao pecado de cisma (12), ou simplesmente a termos entendido metade da realidade mas ainda não toda ela? Será lógico, se você quer que uma pessoa atravesse uma rua, escandalizar-se por vê-la já na metade do trajeto?
Como quer que seja, visto que ele não é verdadeiro papa, a atitude deles não faz deles realmente cismáticos. É certamente uma atitude deplorável, e mais uma prova de que o reconhecimento de João Paulo II não pode, em última instância, ser reconciliado com a Fé Católica e é repleto dos mais graves perigos. Mas erros perigosos e deploráveis podem ser esposados sem que se perceba todas as suas implicações e perigos; não constituem prova de que a pertinácia está presente.
O argumento de que esses tradicionalistas rejeitam pertinazmente as provas de que Wojtyla não é papa e as provas de que a posição deles leva à não ortodoxia teria de ser avaliado em cada caso individual. Estou ciente da lamentável penúria de material cogente e convincente argumentando em favor da vacância da Santa Sé. Muito do que existe está viciado por argumentos altamente discutíveis, como a aplicação do cânon 2.200/2 para presumir a pertinácia. Não é claro, de maneira nenhuma, que mais do que um pequeno número de tradicionalistas tenham encontrado uma demonstração realmente convincente do sedevacantismo e a rejeitado pertinazmente. Não está claro que os outros tenham entendido claramente por que a opinião de Caetano, Suarez e João de S. Tomás não pode ser sustentada hoje em dia com relação a Wojtyla. Nem tampouco é claro que quem direcionou a atenção deles para as implicações insatisfatórias da atual posição deles tenha respondido satisfatoriamente às objeções especiosas que podem ser feitas, e são feitas amplamente, contra o sedevacantismo. Para dar somente um exemplo, a mentira de que ninguém é herege, segundo o Direito Canônico, até que tenha sido oficialmente repreendido e recebido oportunidade de se retratar, é tão difundida que não é suficiente negá-la: ela tem de ser detalhadamente refutada. As almas simples podem não ser capazes de avaliar as provas envolvidas, mas mesmo os que são capazes de avaliá-las precisam primeiro vê-las.
Ademais, como não sou inquisidor nem sou treinado para esse papel, e não conheço ninguém que o seja (13), não é surpreendente que haja diferenças de opinião no julgamento de quem é e não é pertinaz. O que é absolutamente certo é que a caridade proíbe-nos de julgar o mal do nosso próximo a não ser na medida em que a prova seja inescapável. Não há nenhum fundamento possível para considerar alguém cismático em razão de a opinião dele diferir da nossa sobre se algum terceiro é pertinaz em seus erros.
O mistério da iniquidade em obra ao nosso redor não é somente iníquo; é também misterioso. A Providência quis que os tempos fossem confusos, não para excluir da salvação todos aqueles que estão enganados na avaliação de cada detalhe afetado pela confusão, mas, com certeza, para testar a nossa caridade juntamente com a nossa fé. Os paralelos históricos mais próximos que conseguimos encontrar sugerem que devemos limitar nossos anátemas àqueles que se separam do ensinamento conhecido da Igreja quando nenhuma alegação de boa fé é possível. Para os demais, parecem aplicáveis as palavras de Santo Agostinho:
“E contudo, se, dentro da Igreja, homens diferentes ainda detivessem opiniões diferentes sobre a questão, sem entrementes violarem a paz, então, até que um decreto simples e claro seja emitido por um concílio universal, seria correto para a caridade que busca a unidade cobrir com um véu o erro da enfermidade humana, como está escrito: ‘Pois a caridade apaga uma multidão de pecados’. Pois vendo que a ausência dela [sc. da caridade] faz com que a presença de tudo o mais seja vã, podemos muito bem supor que, na presença dela, encontra-se perdão para algumas coisas faltantes.” (Sobre o Batismo, contra os donatistas, livro 1).
Considerações Ulteriores
Claro que a caridade para com pessoas confusas que sinceramente mantêm a Fé Católica e estão determinadas com afinco a sustentar as doutrinas dela até onde as entendem, e a viver e morrer na sua comunhão, não deve ser confundida com liberalismo para com hereges manifestos. João Paulo II e seus semelhantes que, juntando-se a ele, apartaram o jugo suave da Revelação de Jesus Cristo, em prol das heresias manifestas do ecumenismo, liberdade religiosa, salvação universal, com os novos rituais sacrílegos que as acompanham (14), devem ser considerados hereges pertinazes. A ignorância de que essas crenças são contrárias ao ensinamento perene da Igreja é praticamente inconcebível, e aqueles tão ignorantes da doutrina católica a ponto de não saberem disso dificilmente estariam sequer cientes do dever de adesão ao Magistério.
Nosso dever é distinguir quando possível entre os que rejeitaram pertinazmente a doutrina católica (15) e os que inocentemente foram confundidos e desencaminhados embora permanecendo habitualmente dóceis ao Magistério. A caridade nos inclina em favor do suspeito sempre que possível. Desentendimentos são inevitáveis. (16) Se os católicos fossem perfeitamente unidos em seus juízos durante uma vacância prolongada da Santa Sé, seria legítimo perguntar para que serviriam os papas, para começo de conversa. Afirmo que a nossa salvação provavelmente dependerá mais da humildade com que defendemos nossas posições e da nossa caridade para com quem discorda de algumas delas, do que de se tivemos sucesso em alcançar a resposta certa para toda questão complicada. Eu, pelo menos, tenho tentado com afinco alcançar as respostas certas faz mais de dezessete anos, com numerosas vantagens não disponíveis à maioria dos católicos, e não tenho garantia alguma de não ter mais nenhum erro remanescente a extirpar. Tendo acabado de perceber que estive errado sobre essa questão bastante fundamental da identificação de quem são e não são católicos hoje, não tenho nada além de simpatia por outros que se extraviaram noutros pontos, seja à esquerda ou à direita.
Consequências Práticas
Esta revisão de minhas opiniões tem certas implicações práticas. Ela nãosignifica que os católicos devam frequentar Missas ditas em comunhão com João Paulo II ou que sejam ditas por clérigos que disseminam erros perigosos ou são fonte de grave escândalo. Mesmo quando os sacerdotes em questão ainda sejam membros da Igreja Católica, fatos numerosos militam contra uma tal prática. Mas certamente significa que aqueles que, mesmo assim, as frequentam não devem ser prontamente considerados culpados de cisma ou pecadores notórios. Por onde, não vejo razão alguma que justifique a um sacerdote católico recusar os sacramentos a tais indivíduos; de fato, seria bem errado recusar os sacramentos a qualquer pessoa a não ser que fosse certo que ela é herege, cismática ou pecadora pública.
Evidentemente, segue-se daí que não há razão para os fiéis evitarem um sacerdote sedevacantista em virtude de ele tornar os sacramentos disponíveis a tradicionalistas não sedevacantistas, pois ele está bem correto em o fazer.
E não vejo razão alguma pela qual tudo o que foi dito acima não se devesse aplicar igualmente per se aos que estão associados com clero da linhagem Thuc. Muitos deles acreditam sinceramente que Thuc era um bispo sedevacantista edificante quando de suas consagrações de Carmona, Zamora e Guérard des Lauriers. Que ele não fosse nada assim condena-os por um erro de fato, mas não necessariamente por cisma. Além disso, quem recebe Ordens de um herege ou cismático acreditando de boa fé que este seja católico não incorre em nenhuma censura em razão disso: cânon 2.372 (17). E, como quer que seja, os que recebem Ordens de bispos Thuc de segunda ou terceira geração não contraem necessariamente uma mancha pelo fato original das aberrações de Thuc.
Muitos dos envolvidos acreditam sinceramente na ficção de que Thuc possuía uma faculdade do Papa Pio XI ou XII autorizando-o a consagrar quem ele julgasse apto, a qualquer momento ou lugar. Isso não procede, mas, novamente, um erro de fato ou de prudência não expele ninguém da Igreja Católica.
É um erro imaginar que a legislação da Igreja que exige um mandato papal para a consagração de um bispo (18) seja definitivamente não suscetível de epiqueia, se entendemos “mandato papal” como implicando autorização direta e explícita para cada consagração, concedida por um papa atualmente reinante. Dom Gréa e vários episódios históricos mostram que a opinião contrária é sustentável. Exatamente quais condições seriam necessárias para que uma consagração em nossos dias fosse lícita é um tópico que pede estudo cuidadoso e sobre o qual as opiniões provavelmente divergirão.
Exatamente quais consagrações tradicionalistas são definitivamente válidas nas diversas linhagens é outro tópico acerca do qual, na falta de informações mais completas, as opiniões provavelmente divergirão. Nesse ínterim, se cremos que um determinado clérigo de uma dessas linhagens é católico e que as Ordens dele são válidas, a legalidade das circunstâncias em que ele recebeu suas Ordens não parece constituir fator decisivo quanto a se podemos nos aproximar dele para obter os sacramentos. (19)
Ninguém supõe razoavelmente, em nosso tempo, que receber os sacramentos de um padre implica concordância total com tudo o que o padre acredita e faz em seu ministério. Se implicasse, eu, de minha parte, estaria completamente excluído dos sacramentos.
Desafio
Uma implicação de minha nova posição, delineada neste estudo, é que não considero mais uma questão de importância avassaladora que todo o mundo concorde comigo sobre tudo o que diz respeito ao estado presente da Igreja. Reconheço como meus irmãos católicos aqueles que ainda aderem à posição que eu costumava sustentar, ainda que eles, por um erro inocente, estejam obrigados a me considerar cismático caso aceitem sinceramente, até à última letra, o conteúdo do estudo O Que Todos os Católicos Devem Saber… Declarei os fundamentos de minha mudança de posição, e ampla consulta não suscitou nenhuma tentativa séria de refutar minha demonstração. Assim, a minha própria obrigação em consciência está clara e fico contente de deixar que os outros sigam as suas.
Sem embargo, não consigo me fazer encerrar este estudo sem endereçar dois desafios àqueles que ainda aderem à “velha posição”. O primeiro é este: se você sinceramente acredita que a adesão a um antipapa herético exclui alguém da Igreja Católica, independentemente da boa fé desse alguém, e que estar em comunhão com um cismático exclui alguém da Igreja mesmo se esse alguém equivocadamente considera católico o tal cismático: onde estava a Igreja Católica entre 1965 e 1970, quando o sedevacantismo era praticamente inaudito e quando o número infinitesimal dos que o sustentavam certamente não estava fora da comunhão com outros que o não sustentavam?
Não é resposta dizer que a situação tornou-se mais clara desde então. Essa resposta concede o ponto principal que está em questão, a saber: que a submissão a um pseudo-papa herético, e a comunhão com cismáticos, não exclui necessariamente alguém da Igreja, mas somente na medida em que os fatos estejam claros. Uma vez que isso seja concedido, é inegável que o importante não é o quanto os fatos são claros em si mesmos, mas o quanto eles são claros para cada indivíduo envolvido, o que nos traz de volta à tese principal deste estudo: o fracasso em rejeitar o pseudo-pontificado de Karol Wojtyla não é um ato cismático a não ser que a pertinácia seja evidente.
O meu segundo desafio é ainda mais simples. Neste paper argumentei principalmente contra a primeira proposição listada na página 1: “Todos os que consideram João Paulo II papa devem ser, por esse mero fato e por essa só razão, considerados acatólicos em virtude, ao menos, de cisma.” Mesmo supondo que você permaneça não convencido por meus argumentos e ainda adira a essa proposição, você acredita seriamente que os meus argumentos são tão fracos e indignos de crédito a ponto de ser um ato cismático de minha parte eu ter sido convencido por eles e ter conformado as minhas ações às implicações deles? Se você reconhece que minha demonstração é pelo menos uma demonstração provável e defensável, e que eu, portanto, ainda sou católico (!), você notará que você não sustenta mais a proposição 2: “Todos os que rejeitam João Paulo II, mas permanecem em comunhão com quaisquer outros que reconheçam João Paulo II como papa, devem ser, por esse mero fato e por essa só razão, considerados acatólicos em virtude, ao menos, de cisma.” Então você já mudou sua posição num ponto importante. Também eu enxerguei primeiro de tudo que a proposição 2 era insustentável. Reflexão continuada permitiu-me enxergar que a proposição 1 é igualmente gratuita, e espero que você siga o mesmo caminho.
Este paper é um simples sumário de uma demonstração mais longa apresentada em meu estudo de 32 páginas Cisma e Pertinácia. Dentre os que leram este estudo, a maioria julgou-o convincente. Até o momento, ninguém o rejeitou categoricamente ou sugeriu que a minha mudança de posição é irrazoável, muito menos que é incompatível com continuar membro da Igreja e apto a receber os sacramentos.
Nem, tampouco, leitor algum apresentou até agora um único texto autoritativo que justificasse uma universal presunção de pertinácia por parte de todos os que acreditam equivocadamente que um antipapa herético seja o verdadeiro Vigário de Cristo.
Apêndice 1
Santo Antonino sobre o Grande Cisma do Ocidente
“A questão foi muito debatida e escreveu-se muito em defesa de um lado ou de outro. Pois, enquanto durou o cisma, cada obediência teve em seu favor homens que eram muito doutos em Escritura e Direito Canônico e mesmo pessoas muito piedosas, incluindo algumas que – o que é bem mais – eram ilustres pelo dom dos milagres. Apesar disso, a questão nunca pôde ser resolvida sem deixar as mentes de muitos em dúvida. Sem dúvida devemos crer que, assim como não há muitas, mas somente uma Igreja Católica, assim também só há um Vigário de Cristo que é o seu pastor. Mas se acontecer que, por um cisma, vários papas sejam eleitos simultaneamente, não parece necessário para a salvação crer que este ou aquele em particular seja o verdadeiro pontífice. Basta estar, em geral, na disposição de obedecer a qual deles tenha sido canonicamente eleito. O povo não está obrigado a saber quem foi canonicamente eleito, assim como não está obrigado a saber o Direito Canônico; nessa questão, pode seguir o juízo de seus superiores e prelados.” ([Summa historica (N. do T.)] pars 3, tit. 22, cap. 2)
Apêndice 2
Billot sobre a Natureza da Heresia
“Os hereges dividem-se em formais e materiais. Os hereges formais são aqueles para os quais a autoridade da Igreja é suficientemente conhecida, ao passo que os hereges materiais são aqueles que, estando em ignorância invencível da própria Igreja, de boa fé escolhem alguma outra regra diretriz. Então, a heresia de hereges materiais não é imputável como pecado e, de fato, não é necessariamente incompatível com aquela fé sobrenatural que é o início e a raiz de toda a justificação. Pois eles podem crer explicitamente nos artigos principais e crer nos outros, embora não explicitamente, porém implicitamente, através de sua disposição de inteligência e boa vontade em aderir ao que quer que lhes seja proposto suficientemente como tendo sido revelado por Deus. De fato, eles podem ainda pertencer ao corpo da Igreja por desejo e cumprir as outras condições necessárias para a salvação. Não obstante, quanto à incorporação atual deles na visível Igreja de Cristo, que é o tema que agora nos ocupa, nossa tese não faz distinção entre hereges formais e materiais, entendendo tudo de acordo com a noção de heresia material que acaba de ser dada, a qual, de fato, é a única verdadeira e genuína.(20) Pois, se for entendido pela expressão herege material alguém que, ao mesmo tempo que professando sujeição ao Magistério da Igreja em questões de fé, não obstante isso ainda nega algo definido pela Igreja por não saber que tal foi definido, ou, no mesmo diapasão, defende uma opinião oposta à doutrina católica por crer equivocadamente que a Igreja a ensina, seria bastante absurdo colocar os hereges materiais fora do corpo da verdadeira Igreja; mas, nesse entendimento, o uso legítimo da expressão seria totalmente pervertido. Pois um pecado material é dito que existe somente quando aquilo que pertence à natureza do pecado acontece materialmente, mas sem advertência ou vontade deliberada. A natureza da heresia, porém, consiste em subtrair-se à regra do Magistério eclesiástico, e isso não acontece no caso mencionado [de alguém que está determinado a crer em tudo o que a Igreja ensina mas comete um erro quanto a qual seja o ensinamento dela], já que isso é um simples erro de fato concernente ao que é que a regra dita. E, portanto, não há lugar para heresia, nem sequer materialmente.” (Cardeal Louis Billot S.J., amplamente considerado o principal teólogo tomista dos séculos recentes, em seu De Ecclesia Christi, 4.ª edição, pp. 289-290).
Resulta claro, desse texto, que um mero erro de fato sobre o que a Igreja ensina ou quem é dele o papa não constitui nem mesmo heresia ou cisma materiais. Herege não é quem comete um erro quanto ao que a Igreja ensina, mas quem nem sequer respeita o princípio de submissão ao Magistério. Similarmente, cismático não é quem erra ao julgar se um determinado indivíduo ocupa a Santa Sé, mas quem recusa submissão à Santa Sé. Assim, quando o cânon 731§2 proíbe que os sacramentos sejam dados a hereges e cismáticos que erram de boa fé, refere-se àqueles que estão em ignorância invencível do dever de pertencer à Igreja, não àqueles que erram inadvertidamente num ponto de doutrina ou na avaliação da pretensão de um determinado indivíduo ao papado. Os sacerdotes não podem ministrar os sacramentos a cismáticos nem mesmo se estes foram criados no cisma e não são culpáveis. Seria, porém, um entendimento totalmente equivocado equacionar tais pessoas com os católicos que estão confusos quanto à avaliação do estatuto presente de João Paulo II.
Apêndice 3
São Tiago das Marcas sobre o status daqueles que, de boa fé, são desencaminhados por um “papa” herético
“…supondo que um papa fosse herege, e não condenado publicamente, ainda possuindo seu ofício; supondo que uma pessoa simples, não uma pessoa pública, inquirisse desse Senhor Papa acerca da unidade da Fé, e o papa então a instruísse naquela heresia que ele próprio considerava verdadeira; então um homem assim instruído, se ele não fosse conscientizado [desse erro] por alguma outra via, não deve ser considerado herege, visto que ele se acredita instruído na Fé Católica.” (Citado em Heresy and Authority in Medieval Europe, ed. Edward Peters, London, Scolar, 1980, p. 248)
Aqui o santo postula o caso em que a Santa Sé estaria (ilegitimamente) ocupada por um herege não condenado (como é o caso hoje). Ele considera o caso de alguém que acreditasse que o herege fosse verdadeiro papa e pedisse a instrução deste num ponto de doutrina católica. O “papa”, ao invés disso, o instrui na heresia, e o homem acredita na doutrina falsa. Ainda assim, diz São Tiago, o homem não seria considerado herege, pois a intenção dele é crer na Fé Católica, e o erro dele ocorreu malgrado isso.
Não estamos aqui a um milhão de quilômetros da noção de que a pessoa mal encaminhada já de entrada seria considerada acatólica por estar em comunhão com um herético falso papa? Essa noção nem sequer ocorre ao santo para a refutar; ele insiste que, mesmo que o homem acredite numa doutrina herética com base na “autoridade” do usurpador herético da Santa Sé, ele retém a sua condição de membro da Igreja Católica. Como deveríamos considerar realmente um homem excluído da Igreja quando, num caso similar, ele rejeita as novas heresias, e até mesmo rejeita o usurpador que as está disseminando, mas continua a considerar como irmãos católicos a outros que ainda não enxergaram com a mesma clareza com que ele enxerga?
Ressalva
Este paper dirige-se aos que sustentam a posição que eu antes tinha e que agora considero excessivamente rigorosa. Outros sedevacantistas inclinam-se para o extremo oposto: a opinião de que não há dificuldade ou perigo algum na ideia de frequentar as Missas de sacerdotes que continuam a reconhecer Karol Wojtyla. Não é a minha intenção pôr lenha na fogueira dessa escola. Não tenho a intenção de encorajar católico algum a seguir essa linha nem tenho intenção alguma de eu mesmo a seguir. Não se trata aqui de defender a posição indefensável da F.S.S.P.X. e outros, mas apenas a boa fé de muitos dos seus aderentes. Estou apenas ressaltando que, quaisquer objeções que existam contra a assistência à verdadeira Missa celebrada em comunhão com João Paulo II, estas não incluem a presunção de que o celebrante é necessariamente um não membro da Igreja Católica.
In Festo Dedicationis Sancti Michaelis Archangeli, A.D. 1999
John S. Daly
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1 – (i) “Os que defendem sua própria opinião, não importa o quão falsa ou perversa, sem insistência pertinaz, e procuram com toda a solicitude a verdade, dispostos a corrigir-se ao encontrá-la, não devem ser contados entre os hereges.” (Santo Agostinho: in cap. Dixit Apostolus, xxiv, q. iii; Carta 43, § 162, c.1, n.1)
(ii) “Os que sustentam alguma opinião doentia e perversa na Igreja, se, quando são corrigidos, de modo a trazê-los para a posição correta e sã, resistem de modo contumaz, e não estão dispostos a emendar suas doutrinas pestíferas e letais, mas insistem em defendê-las, são hereges.” (Santo Agostinho: Contra Manichaeos, in cap. qui in Ecclesia, xxiv, q. iii. O santo ensina a mesma coisa no Livro 4, Cap. 16 de sua obra Sobre o Batismo contra os Donatistas, dizendo que quem, por erro, acredita no mesmo que Fotino torna-se herege pela primeira vez quando, a doutrina da Fé Católica tendo-lhe sido dada a conhecer, prefere rejeitá-la e escolhe, ao invés dela, aquela que ele antes sustentava.)
(iii) Cânon 1.325/2: “Herege é quem, tendo recebido o batismo e ao mesmo tempo continuando a se chamar a si próprio de cristão, pertinazmente nega ou duvida de qualquer uma das verdades que devem ser cridas com Fé divina e católica.”
(iv) Bouscaren e Ellis: “Pertinaciter (na definição de herege) não implica em duração nem violência; quer dizer, simplesmente, um homem determinar a mente dele contra o que ele sabe ser a mente da Igreja.” (Canon Law, p. 902)
2 – “…o pecado de cisma é, falando propriamente, um pecado especial, em razão de o cismático visar separar-se daquela unidade que é o efeito da caridade… Por onde, os cismáticos propriamente ditos são aqueles que voluntária e intencionalmente separam a si próprios da unidade da Igreja…” (Summa Theologiae, II-II, Q.39, A.1). O cânon 1.325/2 define o cismático como alguém que “recusa estar sujeito ao Romano Pontífice ou ter comunhão com os membros da Igreja a ele submetidos.” A Bulla Coenaedeclarou excomungados “os cismáticos e todos os que pertinazmenteretiram-se da obediência ao Romano Pontífice reinante”. (destaques acrescentados)
3 – (i) Cf. De Lugo: Disputa sobre a Heresia e os Hereges, seção V, n. 156 et seq.
(ii) “A obstinação pode ser presumida quando uma verdade revelada tiver sido proposta com clareza e força suficientes para convencer um homem razoável.” (Dom Charles Augustine: A Commentary on Canon Law, Vol. 8, p. 335.)
4 – O cânon 2.316 classifica como “suspeito de heresia” quem participa nos ritos religiosos de hereges. Os canonistas especificam que isso afeta somente aqueles que cometem a infração conscientemente.
5 – (i) “Finalmente, não podem ser contados entre os cismáticos aqueles que recusam obedecer ao Romano Pontífice por considerarem a pessoa dele suspeita ou duvidosamente eleita por conta de rumores em circulação…” (Wernz-Vidal, Ius Canonicum, vol. vii, n. 398).
(ii) “Nem tampouco há cisma algum se alguém somente transgride uma lei papal em razão de considerá-la demasiado difícil, ou se alguém recusa a obediência na medida em que suspeita da pessoa do papa ou da validade da eleição dele, ou se alguém resiste a ele enquanto chefe civil de um estado…” (Szal, Rev. Ignatius, Communication of Catholics with Schismatics, Catholic University of America, 1948, p. 2).
(iii) “Tampouco é alguém um cismático por negar sua sujeição ao Pontífice com base em ter dúvidas solidamente fundamentadas [‘probabiliter’] concernentes à legitimidade da eleição dele ou do poder dele [referências a Sanchez e Palao].” (De Lugo, Disp., De Virt. Fid. Div., disp. xxv, sect. iii, nn. 35-8).
6 – “A essência da heresia consiste em um cristão escolher outra regra da fé que não aquela instituída por Cristo; a heresia é rebelião contra a autoridade doutrinal da Igreja Católica e manifesta-se na recusa a crer em doutrinas que a Igreja declarou serem reveladas por Deus. Ora, é evidente que, para essa recusa constituir verdadeira rebelião e, assim, verificar-se a noção essencial de heresia, tem de haver prévio conhecimento de que a Igreja Católica realmente ensina, como pertencente ao depósito da fé, a doutrina negada; não há desobediência à autoridade onde não há conhecimento de que uma ordem foi dada. Seria, portanto, … abuso do termo qualificar de herege a um católico professo que negasse ou duvidasse de uma doutrina que ele não sabia ser parte do ensinamento dogmático da Igreja; tal pessoa não seria nem mesmo pecador ‘material’, pois não seria rebelde.” (Cônego E. J. Mahoney: The Clergy Review, 1952, vol. XXXVII, p.459)
7 – Cf. o tratamento do cânon 1.325/2 pelo Pe. Heribert Jone (Commentarium in Codicem Juris Canonici, vol. II, p.493).
8 – Ver Apêndice 2.
9 – Cf. Cânon 1.323§3, De Lugo: Disputa sobre a Heresia e os Hereges, seção III, nn. 77-8 e Cartechini: De Valore Notarum Theologicarum, pp. 19-20, 27, 74, 87 e 99.
10 – Visto que Roncalli, e Montini no início do seu “reinado”, por todas as aparências eram pacificamente aceites pela Igreja.
11 – Embora o contrário não tivesse sido diretamente definido naquela época, como o foi depois.
12 – É claro que podemos ter sido negligentes em buscar a verdade; podemos ter estado em culpa. Mas a pertinácia exigida para o pecado de cisma implica em muito mais do que isso: “cismáticos propriamente ditos são aqueles que voluntária e intencionalmente separam a si próprios da unidade da Igreja…” (Summa Theologiae, II-II, Q.39, A.1). Aplica-se isso realmente ao estado de espírito em que nos encontrávamos naquele momento de nossa peregrinação rumo à conclusão sedevacantista?
13 – “Os leigos não são juízes competentes em matéria de heresia, mesmo quanto a meras questões de fato.” (Rev. S. B. Smith: Elements of Ecclesiastical Law, vol. 1, p. 362)
14 – Participação nos quais constitui inquestionavelmente expressão exterior de heresia por atos (Cf. A. Xavier da Silveira: Atos, Gestos, Atitudes e Omissões Podem Caracterizar o Herege) devido à sua oposição aos dogmas da transubstanciação e do caráter sacrifical e propiciatório da Missa.
15 – Cf. De Lugo: Disputatio XX, de Haeresi et Haereticis, seções v e vi. É preciso entender que alguém pode ser culpado de negligência mortalmente pecaminosa em determinar a verdade, sem ser pertinaz. A pertinácia implica em afastamento consciente da fé ou da comunhão da Igreja (Cf. Vermeersch-Creusen: Epitome Juris Canonici Cum Commentariis, vol. III, n. 311).
16 – Cardeal Billot: De Ecclesia, Q. VII, explica que não é incomum haver alguma confusão na determinação de se alguém é ou não é realmente católico, e isso não entra em conflito, de modo algum, com o dogma da visibilidade da Igreja.
17 – Aqueles que recebem de má fé Ordens de um bispo herético ou cismático incorrem em suspensão. De boa fé não há censura, mas as Ordens normalmente não deveriam ser usadas sem dispensa. Sendo essa dispensa uma exigência da lei eclesiástica somente, sua necessidade pode ceder à epiqueia em circunstâncias excepcionais como as nossas.
18 – Mesmo após os atos relevantes do Papa Pio XII.
19 – Pode até ser que haja razões prudenciais para evitar padres assim, mas elas não são suficientemente claras para estabelecer uma obrigação definida, especialmente quando as demais fontes legítimas dos sacramentos estão em escassez.
20 – O Cardeal Billot escreve aí para explicar sua décima-primeira tese sob a questão 7 da obra em tela. Essa tese lê-se como segue: “Se bem que o caráter batismal é suficiente por si próprio para incorporar um homem na verdadeira Igreja Católica, é exigida, sem embargo, uma dupla condição para esse efeito nos adultos. E a primeira condição é que o vínculo social da unidade da fé não esteja impedido por heresia formal ou mesmo material…”
Trad. por Felipe Coelho, com adaptações do editor do site.
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